Nossa cidade completa neste mês 47 anos. Veja um pouco
de sua História através do relato de minha infância na década de 1970.
Momento presente: Shopping
Center, Lan House, vídeo game, condomínio fechado, bonecos de super-heróis,
escolinhas de futebol com grama sintética, carrinhos de ferro para coleção... Década
de 1970: patinete e carinho-de-lomba de rolimã, futebol de rua, jogo da cela,
bolinha de gude, taco... Acompanhando o crescimento de meus filhos, Henrique e
Fernanda, vejo como a infância deles está sendo diferente da minha. Acho
importante resgatar a memória de como era a infância na década de 1970,
principalmente em uma cidade periférica como Alvorada, onde a população nunca
teve acesso a grandes inovações da mídia.
Estudar pela manhã era sempre o desejado pela
garotada, pois assim teríamos à tarde para brincar, e a principal brincadeira
era jogar bola. Naquela época jogávamos todos os dias e o campo era o meio da
rua. Fazíamos goleirinhas com tijolos ou lata de azeite dividia-se dois ou três
para cada lado e passávamos a tarde jogando, muitas vezes reunia-se muitos
garotos e formavam-se quatro ou mais times, o que terminava em um torneio onde
as disputas eram acirradas. Mas não era só futebol! Como a falta de brinquedos
era grande, poucas crianças tinha carrinhos e bonecos e, quando tinham não
tiravam de casa, a saída era improvisar. A partir de madeiras e rolimãs,
construíamos patinetes e carinhos-de-lomba. Claro que não era qualquer um que
fazia, mas uns ajudavam os outros. Descer a lomba da Castelo Branco (Parada 43)
numa disputa com um colega era de dar inveja os jovens que hoje muito
precocemente disputam corridas de Kart.
A maioria das brincadeiras envolvia disputas como
jogar bolinha de gude “as verda”. Esta expressão significava que se você
ganhasse as bolinhas de seu colega no jogo, elas seriam suas. Não vou negar que
muitas vezes acabávamos brigando, mas diferente de hoje, as brigas não iam
muito além do momento, no dia seguinte estávamos brincando novamente. Outra
brincadeira que dava disputa era jogar taco, cuja finalidade era para quem
estava com os tacos, acertar uma bolinha arremessada pelo adversário e trocar
de lado com seu colega antes do adversário pegar a bolinha. Para quem estava sem
os tacos, o objetivo era acertar a casinha do adversário com a bolinha para ter
direito a ficar com os tacos. Brincávamos com carinhos feito de lata, com pneus
velhos, com latas de leite ninho cheias de areias puxadas por fios de nylon, de
se esconder quando caia a noite, de campeonatos de jogo de botão e também jogar
chimpa. A chimpa era uma pedra em forma de circulo onde você teria que acertar
a de seu colega e vice-versa. O mais interessante é que naquela época não se
jogava a dinheiro, mas criávamos toda uma estrutura financeira de valores a
partir de carteiras de cigarro para apostarmos no jogo de chimpa. Cada marca de
cigarro recebia um valor.
Nem tudo era só brincadeira,
havia as aventuras. Morava na Vila Fontoura. Nesta época não existia o Jardim
Porto Alegre, muito menos o Jardim Algarve e o Porto Verde. Ainda não havia
projeto para a construção do BIG e o RS Futebol. Toda aquela área era uma
verdadeira mata, com muitas árvores e pássaros, além do arroio que passava por
meio dela. Saíamos para cassar passarinho armados de fundas (estilingue), uma
arma feita de forquilha de árvore com caninhos de soro amarrados em cada parte
da forquilha com um corinho na outra extremidade para se arremessar uma pedra.
Se não era para caçar, íamos pescar no arroio. Muitas vezes nos embrenhávamos
no mato e ficávamos até perto da noite, o que gerava pavor devido a lendas de
fantasmas e assombrações que apareciam na mata, embora nunca tenha visto nada. Mas
a maior lenda urbana, sem dúvida era o “velho do saco”, porque este realmente
existia e nós o conhecíamos. Tratava-se de Seu Quiquito, um velhinho que andava
pelas ruas atrás de pasto, e para isso usava um saco nas costas e uma foice nas
mãos. Mas vai contar para as crianças daquela época que o “velho do saco” não fazia
mal!
Nos fins-de-semana a diversão era acompanharmos os
times de nossa vila nos jogos do campeonato amador da cidade. Torcíamos pelo
Fontoura e, principalmente pelo Unidos. Também tinha o Cine São Jorge, que
poucos acreditam que existiu. O “pulguinha” como era carinhosamente chamado
costumava passar filmes de artes marciais na matinê, domingo à tarde. Mas a
idade foi avançando e novas diversões foram surgindo, como as discotecas.
Estávamos deixando a infância para entrar na adolescência. Resgatar as memórias
de minha infância é também resgatar as vivências do povo desta cidade.
Texto:
Denilson Rosa dos Reis
Originalmente
publicado no livro Raízes de Alvorada
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